Na Argentina, inflação e dólar batem novos recordes
Com suas reservas internacionais derretendo, a Argentina busca desesperadamente recursos para continuar pedalando a economia até pelo menos as eleições de outubro.
A mais recente injeção de recursos virá da Arábia Saudita, cujo Fundo de Desenvolvimento criado para financiar projetos em economias emergentes decidiu liberar uma linha de financiamento para o país. Serão US$ 500 milhões para projetos de infraestrutura, entre eles o gasoduto Néstor Kirchner.
A falta de confiança no governo de Alberto Fernández empurra o dólar paralelo para novos recordes, atingindo 400 pesos. A desvalorização cambial por sua vez retroalimenta a inflação, que bateu nos 7,7% em março. No acumulado em 12 meses, a taxa está em 104,3%, a maior desde 1991. Os aumentos de preços já superam os da Venezuela, colocando a Argentina no posto de país com a maior inflação no continente.
“O número que vimos hoje representa o pior momento do impacto da guerra nos preços internacionais e da pior seca da história do país,” disse a porta-voz da Presidência, Gabriela Cerruti, fingindo que o problema é todo exógeno. Difícil será convencer a população castigada pela carestia e retração na atividade econômica.
Sergio Massa, o superministro da Economia, está em Washington para as reuniões de primavera do FMI e do Banco Mundial e busca alternativas para recuperar o caixa de seu país. O acordo com os sauditas foi selado em um encontro com o sultão Abdulrahman Al-Marshad, o CEO do fundo. Não foram oferecidos detalhes sobre as condições e garantias do empréstimo saudita, mas foi um gesto raro nos últimos meses.
Desde seu calote mais recente nas dívidas de investidores privados, em 2020, a Argentina tem encontrado as portas fechadas quando sai ao mercado. Além do dinheiro saudita, Massa conseguiu até o momento um aporte de US$ 600 milhões do BID, em recursos que deverão ser destinados à área de saúde. Outros US$ 950 milhões devem vir do Banco Mundial para programas em educação principalmente. São recursos com destino específico, que pouco contribuirão para reforçar as reservas líquidas em moeda forte.
Oficialmente, as reservas estão em US$ 38 bilhões. As reservas líquidas, no entanto, representam uma fração desse valor e o governo oferece poucos detalhes a respeito, o que apenas aumenta a insegurança dos investidores. Analistas locais estimam que os valores líquidos ficam ao redor de US$ 6 bilhões. Uma boa fração do saldo declarado é na verdade swaps feitos com instituições chinesas.
Os argentinos não estão cumprindo os termos do acordo renegociado com o FMI no ano passado. A inflação, por exemplo, deveria recuar para 60% ao final de 2023. Agora o cenário ficou ainda mais difícil por causa da seca histórica que castigou a colheita de grãos. O Banco Central da Argentina mantém a taxa de juros básica abaixo da inflação galopante. Sem opções de investimentos financeiros que assegurem a proteção de suas poupanças, os argentinos compram dólares.
A cotação do blue, como os argentinos chamam o dólar livre no mercado paralelo, é praticamente o dobro do câmbio oficial: 400 pesos contra 220. A situação das reservas internacionais só não é pior porque o governo decidiu criar uma taxa de câmbio especial para alguns exportadores e contratos de derivativos, o “dólar soja”, cotado a 300 pesos – 37% acima do câmbio controlado –, e assim incentivar operações de venda internacional.
Apesar das metas não cumpridas, o FMI vem liberando as parcelas do programa de US$ 44 bilhões aprovado no ano passado. Massa tenta renegociar, mais uma vez, as condições para manter acesso aos recursos. Voltou de Washington com a promessa de receber um novo alívio nas exigências a serem cumpridas – dessa vez, em razão do impacto da seca na produção agrícola.
Há duas semanas, Alberto Fernández esteve com Joe Biden na Casa Branca e pediu que o FMI continue respaldando os argentinos. A instituição multilateral tem sido tolerante até aqui. Mas o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou, durante a cerimônia da posse de Dilma Rousseff na presidência do Banco dos Brics, que “nenhum governante pode trabalhar com uma faca na garganta porque está devendo”. Ainda segundo Lula, “não cabe a um banco ficar asfixiando as economias dos países como está fazendo com a Argentina o Fundo Monetário Internacional”.
O setor de móveis ainda não foi afetado, pelo menos não por enquanto. No primeiro trimestre as exportações de móveis para a Argentina registraram alta de 31%, segundo dados do mdic.
(Com informações BrazilJournal)
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